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sexta-feira, 25 de abril de 2008

O MAIS DOCE DOS VENENOS

O mais doce dos venenos





Nestes tempos em que se faz até um fórum para debater o açúcar, é interessante se pensar um pouco mais no papel da sacarose em nosso mundo.

A história deste vício tolerado, estimulado e defendido pelas maiores empresas do mundo (todas as multinacionais da área alimentar, por exemplo) é marcada por sangue, sofrimento, todo o tipo de doenças e morte.

Seu uso inicial pode remontar à antiga Índia de 325 ac, quando foi descoberta pelo ocidentais graças a Alexandre Magno. O açúcar de cana não era de conhecimento dos gregos por isto seu nome é romano (saccarum). O império Persa em 600 dc criou a tecnologia do refino que habilitou o açúcar a ser transportado de forma eficiente. O Islã invadiu a Pérsia e iniciou o controle dos negócios do açúcar. Nesta época e por muito tempo o açúcar seria um produto de valor comercial extremo. Eventos terríveis como as cruzadas e a Inquisição podem estar ligados ao açúcar. É provável que o grande estimulador do surgimento das navegações dos séc. XV e XVI tenha sido o açúcar dentre todas as especiarias.

O maior fermento da escravidão negra foi a indústria açucareira. No Brasil todo o sofrimento do negro está ligado a necessidade de mão-de-obra para cultivar e preparar a cana de açúcar para os refinadores portugueses (na verdade holandeses). O açúcar sedimenta a devastação do meio ambiente no nordeste brasileiro e para fazer da colônia o maior produtor do mundo subjuga milhões de negros africanos à mais estúpida agressão do homem contra o homem de todos os tempos.

O açúcar esteve sempre sob os cuidados dos poderosos, a ponto do nome da doença do açúcar ter o nome ligado ao mel e não a ele mesmo pelo singelo fato do descobridor ser médico de um poderoso rei que detinha poder pela exploração açucareira. Diabete mellitus, poderia ser chamada de poliuria sacarus, (muita urina doce, ou inflamação da urina doce) mas ficou mellitus (de mel) para evitar constrangimentos ou perder sua cabeça, afinal naqueles tempos se cortava a cabeça de inimigos da coroa inglesa, e o dr Willis, eminente médico iria ser mais um numa série infindável de autoridades médicas, até os tempos de hoje, que sucumbiu ao poder supremo da sacarose refinada da cana.

O livro "Sugar Blues" de William Dufty é um poderoso instrumento de compreensão do impacto do doce veneno sobre a espécie humana nestes últimos 2000 anos. É um texto impressionante, pois é uma síntese de ecologia e visão holística sem mencionar tais expressões uma única vez, e foi escrito em 1975!

Levanta questões absolutamente insólitas para as pessoas que não costumam fazer perguntas. Mas você sabia que vai açúcar em tudo praticamente que se ingere, inclusive nos salgados? Você sabia que até o cigarro tem açúcar, e que pode ser pelo uso do açúcar na sua produção que ele se tornou cancerígeno. (Afinal se tem notícia de algum índio que tenha falado de câncer do pulmão na América antiga?)

O açúcar pode estar relacionado a centenas de problemas médicos incluindo todo o tipo de problema de saúde na infância (infecções de repetição, distúrbios de comportamento, ansiedade infantil, hiperatividade falta de concentração etc.), alteração no sistema imunológico, aumento de triglicerídeos, aumento de taxas de colesterol, favorece inúmeros tipo de câncer (cólon, bexiga, ovário, próstata, mama, reto entre outros), aumenta a acidez do estômago, favorece doenças com a doença de Crohn, retocolite, artrite, asma, apendicite, hipertensão, eczemas e alergias em geral, miopia, enxaqueca entre tantos outros males. Há muitos estudos que relacionam inúmeros problemas ginecológicos com a ingestão de açúcar refinado (ovários policístico e crises de TPM). Cáries dentárias, obesidade e diabete são apenas as mais óbvias enfermidades causadas por este aditivo alimentar.

Mas cruzes, pode afetar tudo? É claro pelo mais simples dos motivos: depois da água a substância mais ativa no corpo humano em todas as células vivas é a glicose, (a sacarose, açúcar de cana, se transforma em duas moléculas de glicose). Do cérebro aos rins, tudo se mexe com a adição de sacarose. Quando ingerimos alimentos completos a interação do sistema digestivo com o todo da planta organiza a entrada dos insumos alimentares num contexto de equilíbrio. Quando ingerimos balas ou coca cola o corpo perde minerais e vitaminas para poder absorver a energia pré-digerida do açúcar refinado. Assim o açúcar é um antinutriente pois saqueia o corpo humano. Seu efeito de prazer é tão deletério quanto a pior das drogas, mas como todos os setores da economia estão presos a sua produção e distribuição, será necessário muito mais que um fórum de fim de semana para que uma cultura tão firmemente inserida entre nós se modifique. Mas o prazer é a âncora de todos os negócios.

O açúcar é a materialidade do afeto. Num mundo onde o afeto tem preço, dar bombons e outros doces é muito mais fácil do que ser o próprio afeto. Damos chocolates para crianças e para nossas amantes, assim demonstramos nosso amor por elas e nos desobrigamos de ser o amor em si! O açúcar se impôs porque a materialidade das atitudes humanas sempre foi mais atuante que nossa capacidade de amar. E esta materialidade danificou nossa capacidade de nos relacionarmos com a terra, com os seres vivos e, principalmente: do homem consigo mesmo!



(José Carlos Brasil Peixoto)



Livro "Sugar Blues" - William Dufty, ed. Ground, 197 pgs.

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