Panacéia é coisa do passado?
Diz a tradição grega que as netas de Apolo foram Hígia e Panacéia. Eram filhas de Asclépio, esse, deus da medicina. Higia seria a deusa da boa saúde e Panacéia deusa da cura. Seu nome se transformou em substantivo, com valor adjetivo, o remédio que curaria todos os males.
Abaixo temos o trecho de um e-mail que circula na internet. Esse particularmente já é considerado um “hoax” da rede. Um trecho do conteúdo da mensagem:
Após descobrir um câncer no seio e extirpá-lo, este havia se espalhado pelo corpo, e ela estava praticamente com os dias contados. E foi então que ele descobriu uma publicação (não sei se pesquisando na Internet) sobre o "CHÁ DE GRAVIOLA".
A noticia estava num site ou revista alemã/americana (?) (ele é alemão), e citava varias pesquisas que apontavam a planta como milagrosa.
O titulo da matéria (que ele me mandou via e- mail) é "CANCER "MAGIC BULLET" DISCOVERED, but drug giasnt hushes it up ! - 10,000 times stronger than chemotherapy ! with no adverse side effects... - Descoberta bala mágica contra o câncer, mas os gigantes das drogas se calaram... (extraído do site quatrocantos.com)
Novas indicações para produtos tradicionais
É quase diário. Todos nós recebemos e-mails falando de substâncias que curam. Algumas curam tudo. A lista é muito grande. O câncer, pela sua óbvia reputação, é um dos maiores alvos destas propostas terapêuticas. Possivelmente plantas mais ou menos exóticas são as mais citadas. Mas eventualmente há alguns produtos químicos comuns como o bicarbonato de sódio, ou produtos de origem animal como a cartilagem de tubarão.
Todos apontam para curas. Propostas excepcionalmente interessantes, pois o imenso espectro terapêutico tem a incrível vantagem de não apresentar efeitos co-laterais.
Mas a pergunta correta é: porque ainda estamos a procura dessa formidável substância? Porque, mesmo após a chegada do século XXI, nossa maior preocupação seja com algo tão prodigiosamente curativo?
Terapêutica x prevenção – o ônus do modernismo
A opção pela terapêutica ao invés de se fazer um trabalho de manutenção da saúde é a marca registrada da nossa sociedade. A palavra prevenção em função disso ganhou quase um novo significado em nosso vocabulário. Perdeu a denotação de “evitar que algo aconteça” para ganhar a conotação: “descobrir a doença o mais cedo possível para evitar um dano ainda maior”. Isso fica óbvio quando é disseminada a política de que, por exemplo: mamografia é prevenção de câncer de mama. Obviamente uma mamografia não previne coisa alguma. Apenas pode descobrir um câncer, em tese, numa fase bem precoce. Dessa forma a mutilação terapêutica seria menos expressiva, embora os procedimentos mastodônticos posteriores não costumem ser mais inofensivos, como a radioterapia ou a quimioterapia. Infelizmente não há qualquer informação ordinária que auxilie as mulheres a NÃO terem câncer. Assim ficamos na “esperta” posição de rezar, médico e paciente, para que a “sagrada” mamografia não informe nada de grave frente a real inépcia preventiva nesse campo.
Recentemente temos constatado que a medicina evolui muito. Tanto que ficou muito cara, e tem ficado cada vez mais cara! Na verdade temos procedimentos diagnósticos super sofisticados, técnicas cirúrgicas complexas, medicamentos extraordinários e uma série de procedimentos associados de alta tecnologia. A ciência aplicada à doença é muito profícua! É bem verdade que temos cada vez mais doentes. E praticamente todas as pessoas estão sujeitas a usarem medicamentos.
Muitos de nós acreditamos piamente que esse é o preço da modernidade aplicada à medicina.
Mas é bem provável que se a medicina tivesse realmente evoluído nós não teríamos mais (tantos) doentes. Se a evolução tivesse de fato acontecido, a medicina teria como atividade básica manter as pessoas saudáveis. Preservar a saúde seria a premissa. Nessa ótica, a medicina atual está no oposto da evolução. É um atestado do caos em que estamos metidos!
É possível, na verdade, que estejamos no ápice da involução, visto que praticamente transformamos todos os seres humanos em enfermos, que tomam remédios para absolutamente qualquer coisa, desde a mais precoce idade possível. Aliás, se possível for, será ofertado medicamentos aos estágios uterinos e quem sabe, pré-uterinos da vida!
Desconfiança justificada
O viés desse cenário é a busca constante do medicamento mágico. Que trate da forma mais suave, por exemplo, as mais pérfidas das enfermidades, como o câncer ou o alzheimer. O estranho é que a busca da panacéia pode ser na verdade um atestado de que a sociedade desconfia do modernismo da medicina. Se fosse consenso absoluto de que evoluímos tanto no campo médico, somente os tolos poderiam querer curas quase milagrosas. Mas não é bem assim, algo deve realmente estar errado.
E está! Uma revisão estatística de 2003 mostra números espantosos sobre a eficiência da medicina nos Estados Unidos. O custo humano e financeiro da intervenção médica anual implicaria em 736.000 mortes anuais e 282 bilhões de dólares de despesas. Ainda mais: 16,4 milhões de indivíduos teriam sido submetidos a procedimentos médicos desnecessários e mais de 3,0 milhões de pessoas teriam sido afetadas com reações iatrogênicas! (*)
Assim o progresso tão festejado parece não ter sincronia com a incúria associada. Sendo assim, a saída é mesmo procurar alternativas...
O estilo de vida e a saúde
Boa parte do problema da nossa falta de saúde pode estar relacionada a um aspecto tirânico: o tipo de opção de sociedade que escolhemos. Boa parte das enfermidades que enfrentamos tem a ver com a vida sedentária, com o tipo de alimentação fortemente artificial que consumimos pesadamente impregnada de químicos que são frutos do nosso próprio progresso tecnológico: dos agrotóxicos à manipulação dos solos com insumos fertilizantes. Não temos tempo que não seja utilizado para outras coisas que não o trabalho. Afastamo-nos definitivamente do contato com o sol, apesar da enorme dependência que a química corporal tem com a luz solar. Para garantir esse afastamento transformamos o sol em causa de câncer, nos cobrimos com substâncias químicas artificiais para garantir que o sol não chegue a nossa pele! Aliás, usamos todo o tipo de substância química cosmética com mais tóxicos que vão atuar dentro do nosso organismo de forma perversa. Não tomamos água que não seja envasada! E fluoretada! As vezes edulcorada com aspartame.
Nossas crianças nascem no dia em que planejamos, bem como a natureza preconiza. Elas não brincam mais ao ar livre. Na verdade, entram nas escolas o mais cedo possível, para que se encurte o mais rápido a infância, algo que dá muito trabalho para os pais que não podem ficar em casa, já que ter um dos pais em casa é coisa (horrível) do passado. Os pais aprenderam a ter todo o tipo de culpa em dar limites aos seus filhos! Assim é garantido todo o sofrimento possível na relação de pais com filhos, dos pais entre si, dos filhos com a escola! Algo que parece vai garantir o mais precocemente possível o uso de medicação. (E esses filhos vão garantir o retorno da sociedade à vida sustentável!?)
Dorme-se pouco! Bem pouco! Para garantir o mínimo de melatonina possível disponível! Sem melatonina, que é o antioxidante mais poderoso do corpo, não há a menor chance de se ter saúde! Dorme-se pouco, pois todos estão atolados de preocupações! A maioria das pessoas deve para os bancos, para o governo, para si mesmo! A ansiedade é epidêmica! É bem verdade que a ansiedade é fundamental para que aja consumo! Boa parte do consumo só existe pela pressão da ansiedade, e capciosamente, sem consumo não se gira a economia, todos os empregos ficam a perigo!
Tirar férias, trabalhar menos ou ficar no ócio são sinônimos ofensivos. O tempo para se alimentar é o menor possível! Se possível não faça intervalos de refeição, e melhor ainda será se não precisar abandonar o local de trabalho.
As pessoas aprenderam que tudo é descartável, inclusive as relações pessoais, e principalmente as afetivas! E para evitar qualquer reflexão de algo possa estar errado qualquer sentimento ou postura não compreendida ou não aceita é catalogado como enfermidade! Assim qualquer mudança é impedida, e sob medicação vamos todos estoicamente sobrevivendo, sem mudar nada!
Medicina: a ecologia distante
A medicina é um marco da ecologia aplicada ao ser humano! A natureza é o erro. Nessa linha de pensamento se explica que o nosso corpo, ou partes deles nos adoecem, (afinal o estradiol dá câncer de mama, a testosterona câncer de próstata) ou partes deles são descartáveis ou de função menor, (muitas jovens fazem cirurgia de mama sem qualquer preocupação se um dia poderão amamentar). O desenvolvimento passou a ser alvo de atenção médica. Adolescência precisa de tratamento, menopausa precisa de tratamento, gravidez precisa de tratamento, envelhecer é tratamento garantido. Além do mais se culpa qualquer coisa mais tradicional como causa de doenças horríveis, principalmente os hábitos dos tempos de nossos avôs. Principalmente se temos produtos industrializados substitutos nos dias de hoje.
Dessa forma caminhamos aceleradamente para a manutenção da saúde? De jeito nenhum! Aí é claro que temos que contar com o sistema de saúde! Que estando completamente alinhado a esse modelo patogênico de viver nos fica dizendo todos os dias pela mídia o que fazer. Faça o exame tal com tal freqüência, aquele com tal regularidade. Cuidado com as gorduras! Use esse, aquele e mais daquele produto “natural” (devidamente embalado obviamente). Tome vacina para isso e para aquilo! Fuja dos raios solares! Use produtos “light” e “diet”! Enfim, um arsenal de posturas “bem naturais” para ter a natureza de sua vida dentro de si!
Aprendemos que o ser humano é ápice da evolução das espécies. Isso deve ser uma piada de mau gosto! Se formos o ápice, porque somos a única espécie que sobrevive à custa de medicamentos e insumos artificiais de toda sorte? Somos então uma fraude como ápice? Ou de fato somos, mas de algum modo desaprendemos a sê-lo, porque essa é a fraude?
A natureza escondida
Aí fica fácil imaginar que a natureza deve ter escondido em outro lugar a mágica da saúde! A mágica da cura! Em outro lugar... Geralmente uma planta exótica, ou nem tanto. Pode ser a graviola, o mamão, o brócolis, a quinua, a aloe vera ou o que seja. De qualquer forma algo que não estaria acessível a todos os seres humanos do planeta. (Algo realmente estranho visto que nossa espécie se adaptou a todos os cantos da Terra, em todo o caso, pode ser antipático dizer o contrário)
Mas de qualquer forma, fica a sensação de que a natureza oferece uma cura! Não seria tão injusta!
O fato é que a natureza de fato nos dá a saúde! Para falar a verdade nós nascemos com ela! Nossa cultura deveria saber como mantê-la! Nós aprendemos facilmente a ir perdendo-a diariamente numa sociedade completamente distante da sua própria ecologia. O preço disso é percebido por todos! E tenta-se desesperadamente resgatar o prejuízo com nossas panacéias modernas! Todo mundo as festeja, pois todos nós aceitamos consensualmente que somos enfermos! Somos culpados de alguma coisa! Um povo culpado aceita qualquer coisa para aliviar sua mente.
Como não fazemos nada para mantermos o organismo saudável ficamos a mercê das curas mágicas e das fortunas que giram ao redor do trágico sofrimento humano.
A liberdade de manter a saúde foi perdida há muito tempo atrás... Poderá ser para sempre se não conseguirmos despertar e tomar toda a sorte de atitudes que nos levem de novo à apropriação de nossa condição de seres vivos integrados e pertencentes à natureza, numa perspectiva bastante diversa daquela que estamos aceitando indolentemente. A real e mais eficiente panacéia nunca deixou de sair de dentro de nós.
Alimentos especiais?
Um dos aspectos mais curiosos a respeito das propriedades químicas, no que diz respeito especialmente aos produtos vegetais apresentados como de alto valor terapêutico, curadores até do câncer, é que a rigor, em última análise eles têm sais minerais e vitaminas, além de alguns aminoácidos e ácidos graxos essenciais. Na verdade são alimentos mesmo, e nem mereceriam a pecha de complementos alimentares, já que a maioria é o próprio alimento em si. Ser um alimento “especial” é um adjetivo relativo. Em qualquer ambiente natural especial mesmo é o alimento que habilita um ser vivo a se manter naquela paisagem., especialmente o ser humano, é claro. Para quem vive no pólo norte o peixe e outros seres marinhos são dádivas divinas, de uma das poucas civilizações que não mudou muito em mais de 5000 anos de adaptação. Isso não foi o caso de qualquer outra civilização pós-agrícola, já que todas, a despeito de ainda poderem modificar o meio ambiente, plantando o que poderiam comer, causaram um dano de tal monta a esse meio ambiente, que sucumbiram inapelavelmente. Morreram de fome, e alguns não deixaram qualquer descendente para o futuro para contar em detalhes o que aconteceu...
Jose Carlos Brasil Peixoto - 050109
Próximos artigos: "O câncer - da fisiologia aos culpados habituais"; "Os segredos de um termo vulgar: o Stress".
Referências:
(*) Death by Medicine: Artigo dividido em duas partes e inúmeras referências:
http://articles.mercola.com/sites/articles/archive/2003/11/26/death-by-medicine-part-one.aspx
Veja o artigo: Finalmente em primeiro lugar, nesse site.
Livro: COLAPSO - Jared Diamond - Ed. Record / APAGUE A LUZ - T S Wiley - Ed. Campus
Conheça vários mitos e fraudes da internet que se transformam em e-mails que NÃO devemos repassar no site: www.quatrocantos.com
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